Luiz Carlos Bresser-Pereira
O Estado de S. Paulo, 8.2.1993
.Houve um tempo que acreditávamos todos que o Brasil cresceria sempre, e que sua economia, mais cedo ou mais tarde, alcançaria o nível dos países desenvolvidos. Hoje já não existe mais esta certeza. A ameaça de decadência‚ concreta. Nos últimos doze anos o desenvolvimento brasileiro, medido pela renda por habitante, estagnou. As perspectivas de que o Brasil se tornaria um país desenvolvido no limiar do novo século desapareceram. E hoje, nestes primeiros meses do governo Itamar, depois das grandes esperanças e do fracasso do governo Collor, verifico que o nível de aspirações da sociedade brasileira baixou dramaticamente. Ao se perceber que a inflação está passando do escandaloso patamar de 25 por cento para o de 30, a ansiedade generalizada concentra-se em saber se será possível evitar esta aceleração da inflação. O problema, portanto, não estaria em acabar com a inflação, mas mantê-la em 25 por cento. Ora, se a sociedade brasileira, ou se suas elites dirigentes, sentem-se tranqüilizadas com uma inflação dessa dimensão, que só pode eventualmente ser mantida nesse nível graças a uma taxa de juros real escorchante, ou se já desesperaram de controlá-la, isto significa que renunciamos definitivamente a retomar o desenvolvimento, significa que aceitamos a decadência como nosso destino."Mas não é verdade que tenhamos aceitado - dirá meu leitor incomodado - ainda ontem li que os líderes empresariais cobravam do governo a retomada do desenvolvimento. E os trabalhadores e a classe média não pensam em outra coisa". Sim, esta cobrança existe. Aliás, quem primeiro cobra de si próprio a retomada do desenvolvimento é o próprio governo, é o Presidente Itamar. Mas é exatamente essa cobrança que revela uma profunda alienação da sociedade brasileira. Cobra-se à retomada do desenvolvimento enquanto a taxa de investimento - o principal fator a determinar esse desenvolvimento - caia de 25 por cento nos anos 70 para 15 por cento do PIB em 1992, e a inflação não parava de se acelerar.
O que o governo e a sociedade estão esquecendo é que sem acabar com a inflação e sua causa principal - a crise fiscal do Estado - é impossível retomar o desenvolvimento. É verdade que o Brasil aprendeu a conviver com a inflação. Através de mecanismos de indexação foi possível, até o final dos anos 70, continuar a crescer com taxa elevada de inflação. Mas a taxa "elevada" de inflação dos anos 70 era 40 por cento ao ano. A taxa atual é superior a 1.000 por cento ao ano. Uma inflação desse tipo, em uma economia que continua formal e informalmente indexada, já é uma hiperinflação - uma hiperinflação indexada, inercial. E jamais um país conseguiu crescer em meio a uma hiperinflação.
No meio de um governo caótico, em que o populismo dos anos 50 tem um enorme espaço, Paulo Haddad procura, no Ministério da Fazenda, auxiliado por Antônio Barros de Castro na BNDES, e agora por Yeda Crusius no Planejamento, garantir um mínimo de racionalidade para a economia. Está claro para ele que a estabilização, no caso brasileiro, é prioritária e tem que passar por duas fases: uma de preparação, outra de ataque direto à inflação. Ele nos tem dito isto, com outras palavras, quando condiciona a execução de um plano de estabilização - o ataque direto - ao ajuste fiscal e à consolidação das dívidas do Estado, particularmente as da Caixa Econômica, dos estados da federação, das empresas do setor elétrico, e a normalização das relações financeiras externas do Brasil, através da assinatura do acordo da dívida com os bancos comerciais e o Clube de Paris. Estaríamos agora nesta fase, que avançou com a aprovação do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira. Dentro de alguns meses, caso a inflação se mantenha em níveis razoáveis até lá, haveria condições para o verdadeiro plano de estabilização, que o ministro nos promete.
Não adianta especular como será esse plano. Haddad garante que não será nem um choque heterodoxo nem uma âncora cambial do tipo argentino. Não sei c